terça-feira, 10 de março de 2009

Igualdade e cidadania

É preciso que a Comissão Europeia e os Estados-Membros tomem as medidas que se impõem para valorizar o trabalho, superar diferenças salariais e os estereótipos ligados às tarefas e aos sectores de actividade que discriminam as mulheres.
Em vésperas das comemorações do de Março, Dia Internacional da Mulher, é importante reflectir sobre a situação que se vive, as discriminações e desigualdades que persistem, a desvalorização do trabalho que continua, através da prática de baixos salários, uma das formas mais utilizadas pelo capitalismo para aumentar a exploração dos trabalhadores, atingindo de forma particular as mulheres trabalhadoras, o que também significa uma desvalorização da maternidade, função social fundamental, pondo em causa a igualdade e a cidadania de quem representa mais de metade da população.
Não é admissível que, na União Europeia, mais de 60 anos depois do Tratado de Roma que consagrou o princípio de salário igual para trabalho igual, e mais de 30 anos depois de uma directiva sobre a igualdade de remunerações entre homens e mulheres, se mantenham níveis elevados de discriminação, sobretudo discriminações indirectas, o que está a ser agravado pela precariedade do trabalho e pelo desemprego que atingem mais fortemente as mulheres e os jovens. Os últimos dados fornecidos pela Comissão Europeia referem que as mulheres ganham, em média, menos 17,4% do que os homens, embora 59% de todos os novos diplomados universitários sejam mulheres.
Nalguns países, como Portugal, onde o desemprego é muito elevado, aumentaram as disparidades salariais médias entre homens e mulheres, e apenas o sector público consegue diminuir a média da desigualdade salarial, já que no sector privado aumentou e ultrapassa os 25% essa diferença, contribuindo para que a pobreza tenha rosto feminino, incluindo nas reformadas, que sofrem as consequências dos salários muitos baixos que receberam e sobre os quais foram calculadas as pensões de reforma, dando continuidade à desigualdade de que foram vítimas enquanto trabalhadoras. Por isso, em média, na União Europeia, entre as mulheres com 65 anos ou mais, 21% correm riscos de cair na pobreza em comparação com 16% dos homens. Sabe-se que, em Portugal, a média das pensões e reformas de mais de 1,5 milhões de reformados mal chega aos 330 euros por mês, o que dá um quadro da gravidade da situação de pobreza que atinge as mulheres idosas.
É preciso que a Comissão Europeia e os Estados-Membros tomem as medidas que se impõem para valorizar o trabalho, superar diferenças salariais e os estereótipos ligados às tarefas e aos sectores de actividade que discriminam as mulheres. É preciso valorizar as profissões e actividades onde predominam mulheres, sobretudo em sectores do comércio e de algumas indústrias, como demonstrei no relatório sobre o papel das mulheres na indústria, de que fui autora no Parlamento Europeu.
Sabemos que em alguns sectores industriais as mulheres são a maioria dos trabalhadores, como acontece no têxtil, vestuário e calçado, em áreas da indústria alimentar, da cortiça, das cablagens, material eléctrico e electrónico, enquanto ainda escasseia a sua participação nas áreas da tecnologia de ponta, o que exige algumas abordagens diferenciadas, mas com um objectivo comum de promoção das mulheres que ali trabalham, de garantia de práticas não discriminatórias no acesso ao emprego e na contratação, no respeito da igualdade de salários, na criação de oportunidades de carreira, de formação profissional, de boas condições de trabalho, de melhores remunerações e de valorização da maternidade e da paternidade como valores sociais fundamentais.
Claro que a necessidade de garantir o emprego com direitos às mulheres que trabalham na indústria e de continuar a facilitar o seu acesso ao trabalho neste importante sector da produção implica também uma maior atenção à situação das várias indústrias na União Europeia, aos desafios que enfrentam e às respostas adequadas que é preciso encontrar, incluindo no comércio internacional e no acompanhamento da situação de importações de produtos mais sensíveis, como no sector têxtil.
Por outro lado, o combate às discriminações salariais que persistem e afectam as mulheres trabalhadoras, designadamente discriminações indirectas, implica aprofundar a criação de uma metodologia de análise de funções capaz de garantir os direitos em matéria de remuneração entre mulheres e homens, que valorize as pessoas e as profissões e, simultaneamente, dignifique o trabalho como elemento estruturante para o aumento da produtividade, da competitividade e da qualidade das empresas e para a melhoria da vida dos trabalhadores e das trabalhadoras.
É de fundamental importância a negociação e a contratação colectiva para combater a discriminação das mulheres, nomeadamente nas áreas de acesso ao emprego, nos salários, nas condições de saúde e segurança no trabalho, de progressão na carreira e de formação profissional. Mas os Estados-Membros e a Comissão têm especiais responsabilidades e um importante papel a desempenhar na promoção da igualdade e no combate a todas as discriminações, na garantia do emprego com direitos e no combate à precariedade do trabalho que afecta.
Por isso, como se sublinha no relatório referido, apela-se a que actuem, seja através da definição de normas elevadas para a protecção da saúde no trabalho que tenham em conta a dimensão do género e, em especial, da maternidade, seja da organização e do tempo de trabalho, que respeitem a vida familiar, seja através da criação de mecanismos de fiscalização eficaz, do cumprimento dos direitos laborais e da liberdade sindical, seja também da garantia de acesso universal a uma boa segurança social pública e a serviços sociais a preços acessíveis, designadamente creches, infantários e apoios a idosos.
Por tudo isto, este ano, as comemorações e lutas do 8 de Março devem continuar também na manifestação de 13 de Março promovida pela CGTP, na defesa dos direitos de quem trabalha, mulheres e homens.

por Ilda Figueiredo

in Semanário, de 6 de Março de 2009



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